quarta-feira, 16 de março de 2011

"Flexi-gurança"

"Reality Bites" (1994), realizado pelo Ben Stiller (!), um filme com Ethan Hawke e Winona Ryder, que, na já década de 90, retratava a realidade do contacto dos jovens da denominada "Geração X" com o "mundo real", após a Universidade.

Penso que sim, que é um pouco isto que a Carla diz. É certo que vivemos uma época muito dura e existem poucas oportunidades, a vida está muito cara, há muitas desigualdades e injustiças sociais, há uma grande estagnação económica e pouco dinamismo das estruturas de emprego. E, ainda mais preocupante: há assimetrias sociais que se vão acentuando cada vez mais.

Mas em Portugal também ainda existe muito pouca flexibilidade no que diz respeito a várias coisas. Pouca flexibilidade e pouca capacidade de adaptação das pessoas. Concluir um curso numa determinada área não é nem pode ser um sinónimo automático de desempenho posterior de uma actividade profissional nessa mesma área. Em Portugal ainda se cultiva pouco a adaptabilidade, e alimentam-se perspectivas algo limitadas. Quer da parte das empresas, é certo, mas também da parte das pessoas. E as pessoas terão de se habituar à ideia de que o conceito e a realidade de um emprego estável, para toda a vida, acabou. Isso era a utopia dos anos dourados do pós-Segunda Guerra Mundial. Provavelmente, passaremos é a ter vários empregos ao longo da vida. E muito provavelmente em áreas muito diversificadas entre si. Ou seja, exige-se hoje das pessoas mais versatilidade e polivalência.

Por outro lado, vejo que também há alguma resistência e rigidez em termos de mobilidade geográfica das pessoas. Há ainda muito a ideia enraizada de que temos de trabalhar e morar no sítio onde nascemos e estudámos, e perto da família. A sociedade portuguesa tem ainda traços muito tradicionais em relação a isto. E também isto terá de mudar.

Aliás, nada disto (a flexibilização do emprego de um modo geral) é novidade lá fora. Aquilo que enfrentamos hoje já é uma realidade há muito noutros países. A maior parte dos países europeus mais avançados passou por isto há uns quinze ou vinte anos, na década de 90, sobretudo. A questão é que em Portugal as mentalidades também têm de ser um pouco trabalhadas (e, lá está, flexibilizadas).

Em Dezembro de 2007, falou-se muito nisto, aquando da assinatura do Tratado de Lisboa. Da possibilidade de se definir estratégias de flexibilidade nas estruturas económicas para uma maior competitividade à escala global, procurando a salvaguarda da estabilidade no emprego e a segurança dos trabalhadores. Ou seja, a tal "flexi-gurança" como conceito-chave subajcente às novas políticas. Mas, se calhar, ou já muitos não se lembram ou não ligaram muito ao que estava a ser discutido...

6 comentários:

  1. A isto há que juntar ainda o pessoal que tirou um curso por gosto, pq é apaixonado por cinema, teatro, turismo, literatura, e afins e que depois se vê à nora pra arranjar um emprego bem pago pq a cultura em Portugal é pouco valorizada. Mas vamos lá a ser realistas. Se eu tirar um curso de cinema na Lusófona, num País onde se faz meia dúzia de filmes por ano, será que tenho o direito de querer trabalhar em Freixo de Espada à Cinta e ganhar 1500 euros por mês?
    Falta muito bom senso para lá da flexibilidade.
    No outro dia dei uma rabecada descomunal a uma das miúdas da Candeia, pq não tem onde cair morta, está a trabalhar em coisas temporárias e tem o 12° ano, e qdo interpelada sobre que curso vai escolher me responde: artes do espectáculo, produção de cenários. Eh pa, deves estar a brincar!
    Falta bom senso, falta realismo, falta menos morangos com açúcar em q os putos vao viver juntos pra uma alta casa com 18 anos. Falta juízo, falta cabeça e falta cérebro.
    Mesmo assim, gostei de ver as pessoas na rua, pq há mto boa gente disponível pra mudar de cidade, de país, de profissão, e que mesmo assim está mto à rasca. Beijos

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  2. É mesmo! Há muitos desajustes: entre as expectativas das pessoas e o que o mercado de trabalho tem para oferecer; entre os cursos/Universidades e o meio empresarial, etc. etc. Vivemos no meio de desfasamentos (e faltas de bom senso, lá está) muito grandes. O que não impede a legitimidade de muitas das queixas das pessoas que estavam na manifestação.
    Bjnhs!

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  3. Ora aí está um bom exemplo. Eu abandonei a minha cidade, Coimbra, fui trabalhar para o Algarve supostamente para trabalhar na minha área, tal não foi o caso mas fiquei, agora estou em Lisboa.
    Ganho mal, não discuto isso, mas trabalho, pode ser em algo que não sonhava, e tenho a sorte de os meus Pais terem condições para me ajudarem quando tal é preciso.

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  4. Maria,
    então temos percursos muito parecidos. :) O meu, tem isso tudo. Deslocação geográfica, área profissional diferente da académica, alguma precariedade. É o que temos. Mas acredito que, se as coisas evoluem, terá de ser para melhor, um dia :)

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  5. É um retrato muito fiel do que se passa. Posso fazer um link ao teu post no meu blog? São aqui focados os pontos principais :) O enraizamento, nos nossos dias, é um veneno que mata aos poucos, mas a resistência a respirar outros ares é muita, demasiada. Mesmo na malta mais jovem... que sim senhor, experimentar 3 meses fora, mas depois, estabilidade, cantinho para morar jutno das pessoas de sempre e um trabalho na área que em que se estudou e assentar. É um erro crasso.

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  6. Pusinko,
    eu não sei se será um erro crasso, toda a gente procura um mínimo de estabilidade. O problema é que isso é cada vez mais raro e difícil hoje em dia, e as pessoas não se convencem que são elas que terão de se adaptar.

    E, claro, podes fazer os links que quiseres. :)

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