quinta-feira, 1 de março de 2012

A senhora Barzini, os estereótipos e outras coisas





Meus amigos, este é um caso terrífico e dramático (not). Pode não parecer, mas estas fotos retratam uma única e a mesma senhora: uma italiana, Benedetta Barzini que, nos anos 60 e 70, foi uma modelo internacional de reconhecido sucesso. Sucede que, a certa altura, lhe aconteceram umas apoquentações na vida e, vai daí, abandonou o mundo da moda, e o seu destino levou uma curiosíssima reviravolta: tornou-se marxista e feminista "radical", e hoje, aos 68 anos, é uma académica e militante comunista. Ora até aqui tudo muito bem.


Infelizmente, minha gente, como que por arrasto, e como as fotos demonstram, todo o seu glamour e encanto foram-se, como que removidos pela vassoura implacável do quadrante político-ideológico onde se move actualmente. Bem, não sei se foi bem assim, mas aqui está ela hoje, de cigarro pendurado nos queixos. Ora, eu não tenho nada a ver com isto e, obviamente, o problema (ou não) é da senhora Barzini e não meu.

Mas ver a senhora Barzini fez-me lembrar que sempre achei muito engraçados certos estereótipos. Entre eles, o de que o esmero no vestuário pode comprometer ou colidir com a seriedade ou a legitimidade das ideias que se defende. Como se o aprumo pessoal reflectisse alguma vacuidade intelectual. Como se um estilo mais esmerado retirasse alguma seriedade à força com que se defendem ideais.



Acreditem, sei do que falo: tenho amigas do Bloco de Esquerda - lembram-se? Assisti à evolução delas, que percorre aquela espiral infernal desde o blazer da Mango até às desgraçadas Birkenstock e aos bombachos à Mahatma Ghandi. (Atenção, filhos!, nada contra quem os usa, mas eu, que gosto das minhas amigas, dá-me dó, pá. Já não posso ir ter com elas à Zara da Baixa, agora tenho de andar num mercado das pulgas em Nova Delhi. Pronto.)


Obviamente, trata-se de um interessante statement a nível social, do "reforço" a nível estético de um determinado status. Mas, ainda assim, há coisas que eu nunca irei compreender. E, se até entendo que algumas convicções sócio-políticas podem ser conotadas com algum despojamento, nunca percebi porque é que esse despojamento terá de ir até ao limite, ou mesmo roçar o desleixo total. Eu creio firmemente que uma coisa nunca inviabilizará ou retirará credibilidade à outra.




Posto isto, lanço um sentido apelo à signora Barzini: por favor, reconsidere. Não deixará de ser uma brilhante académica com ideias bem fundamentadas se recuperar aí uns 32% do seu antigo cuidado com a imagem. Pense nisto. Ou, pelo menos, abdique do ar de estivador com cigarrinho ao canto da boca.

16 comentários:

  1. Eu já fui uma militante da extrema esquerda mais ou menos bem vestidinha. Mas agora que falas nisso, se calhar era por isso que não gostavam muito de mim....

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  2. De acordo com o texto, não faz sentido uma pessoa se tornar desleixada por questões ideológicas. No entanto, quando olho para a Joana Amaral Dias, naquela excessiva pose de tia, muito bem cuidada (e certamente já com alguns retoques de bisturi), não consigo crer que realmente se interessa pelos mais desfavorecidos e que luta por uma justa igualdade social...
    Tenho assim uns mixed feelins sobre o tema.

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  3. Não podia concordar mais. Também n compreendo essa necessidade de ajustar o vestuário a certas "mentalidades", politicas o q seja.
    Uma tipa lá pq se pinte, moderadamente, e meta um vestido bonito, n perda a capacidade de defender ideias de esq (pegando no exemplo), tal como alguém de calças de ganga e t-shirt e sem cabelinho à foda-se n deixa de ter a capacidade de defender ideias de dta conservadora se for essa a sua ideologia.

    Compreendo a necessidade de ajustar o vestuário em mtas situações. Mas n necessitamos de levar a coisa ao extremo...

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  4. este tema é tanto a minha praia, adorei

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  5. Rita,
    pois... às vezes, há algum pessoal muito tolerante, mas só se tivermos ideias parecidas com as deles ;)

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  6. Brisa,
    na minha modesta opinião, o problema da Joana nem é o da pose de tia nem o da aparência, é o da inconsistência do discurso em várias vertentes...

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  7. Me,
    é isso. Mas é engraçado como estas ideias e associações se enraizam na forma de pensar da maior parte das pessoas. É de esquerda, anda maltrapilho. É de direita, é beto/a. Às vezes faz bem questionarmos um pouco.
    Bjnhs :)

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  8. Beatrix,
    vamos lançar um abaixo-assinado para salvar a Barzini e as outras todas? :))

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  9. Adorei!
    Dá-se um caso parecido com a clássica lésbica que se veste à camionista e tem um corte de cabelo que não lembra ao diabo. Não podem ser girlie, OK, mas precisam de se trambolhitos?

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  10. Alexandra,
    ui...esse é um tema que eu nunca compreendi. E também não entendo aquelas que gostam das que parecem autênticos homens. É que para gostar de uma quase-homem, mais vale gostar de um homem-homem, que já vem todo equipado. Mas pronto, elas é que sabem.

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  11. Vou ser completamente fútil: o vestido vermelho da foto é qq coisa de fabuloso! Adorei!
    Qto ao assunto em si, desde que uma amiga minha me disse que lhe chamavam "freak lavadinha" por ser artista mas não ter ar de vasculho, que cheguei à conclusao que tu chegaste. Mas eu sou mais radical: desiste, nao há nada q possas fazer.Aliás, há uma coisa: ignorar completamente qq opiniao alheia sobre a tua pessoa. Funciona!

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  12. Andorinha, linda, eu sigo essa tua cartilha religiosamente! :)
    Bjnhs!

    (PS: o vestido é Oscar de la Renta dos anos setenta!)

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  13. o mais ridículo é que grande parte dessas pessoas "do bem", que encarnam a personagem, fumam ou drogam-se com um ar de quem não sabe quem é Philip Morris ou Pablo Escobar...diz que é natural!

    (não é que tenha muito contra o tabaco e as drogas, mas torna essa posição ainda mais inconsistente...)

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  14. Alima,

    diz que sim, diz que é natural ;)

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  15. nunca percebi porque é que as 'pessoas' do Bloco de esquerda se vestem tão...daquela maneira, será o fashion statement delas enfim, porque se calhar não se deve poder ser do Bloco de esquerda e fazer compras na Zara na mesma vida

    Eu percebo +- a ideia, vestir é mais uma forma de expressarmos as nossas ideias, e tal como a falar, não queremos ser mal interpretados (eu escolho a roupa como quem escolhe palavras, penso sempre o que quero dizer e volta e meia digo coisas sem pensar e arrependo-me, porque só tenho uma vida para ser uma diva lol) mas depois há o desleixo e a tonhice em que por vezes as pessoas que querem expressar um 'não ligo a essas futilidades' caem. E ainda por cima há infinitas hipóteses mais giras e ao mesmo preço por onde se podia escolher, porque sair de casa para comprar uma coisa horrorosa gasta o mesmo tempo e energia de comprar a coisa que está ao lado não tão horrorosa. Mas acho que até prefiro esse look mais recente da Barzini ao blazer da mango *boring* (há gente que segura mas não foi nessa gente que pensei quando lia o post)

    No final o argumento é sempre: são opções estéticas, cada pessoa veste-se de acordo com a estética que tem na cabeça (influenciada por revistas, filmes, grupos a que pertençam, as ideias tem uma estética associada, por isso os adolescentes mudam tantas vezes de estilo, porque mudam de ideias de 3 em 3 meses p'rai) mesmo as que se vestem desleixadamente, ou é uma opção que acham que tem a ver com o seu estilo de vida, ou é falta de tempo e depois concorrem aos extreme makeovers e ficam super felizes com o resultado

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  16. Here, here, Beatrix! :)

    Outra coisa interessante é ver como o vestuário também reflecte muitíssimo o estado psicológico e o nível de auto-estima da pessoa. Quando falaste na falta de tempo e nos make overs, lembrei-me disso.

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